Bolsas

Câmbio

Colunistas

Emocione para se comunicar com os consumidores populares

Marco Roza *

Do UOL, em São Paulo

A principal característica de um empreendedor é ser também inovador. Mesmo repetindo produtos e serviços da concorrência, a inovação é essencial para vincular a nova empresa com os novos nichos que se formam a todo momento no mercado, como as ondas.

Surfar com algum sucesso como recém-chegados exige estarmos preparados para vários tipos de ondas de consumo que se sustentam em variáveis também aleatórias como disponibilidade financeira, taxas de juros e/ou de emprego (ou desemprego) no mar de consumo que o empreendedor escolher para se lançar.

E o mais importante é conseguir tornar sua empresa numa das referências de consumo para essa população que você, como empresário, aprenderá a respeitar mas que dificilmente conhecerá cada um dos seus fregueses pessoal e profundamente.

Aberta a empresa e confirmado o CNPJ a sorte está lançada e lhe resta agora ajustar sua estratégia para se manter na superfície e conseguir, quem sabe, atingir níveis de lucratividade que o assegurem uma navegação mais ou menos estável nessa nova vida que escolheu.

Analfabetismo funcional de quem tem menor renda

Uma das alternativas mais em voga é vender para a nova classe média. No total, ela gastou R$ 1,1 trilhão, em 2011. E com a nova redução de juros e a ampliação de oferta de crédito, deve aumentar ainda mais o consumo em 2012.

Esse montante excita a cobiça não só dos novos empresários que chegam agora ao mercado mas também das grandes corporações que até recentemente nem percebiam o poder de compra dessa população.

Mas chegar até seus bolsos não é tarefa fácil. Porque, apesar de estarem concentrados em regiões, bairros, favelas e comunidades, o dinheiro é curto no bolso de cada um deles. Portanto, se você conseguir chegar com seu produto ou serviço terá que apostar na escala e no preço, simultaneamente.

Mas, mesmo vencida essa enorme dificuldade, ainda não é suficiente. Porque você sustentará seu novo empreendimento com todas as suas economias e apresentará algo inovador num mercado em que três de cada quatro consumidores muito provavelmente terão imensas dificuldades de entender suas mensagens comerciais, o conceito de sua marca, as qualidades diferenciadas do que você pretende vender.

No Brasil, 75% das pessoas entre 15 e 64 anos não conseguem ler, escrever e calcular plenamente. Esse número inclui os 68% considerados analfabetos funcionais e os 7% considerados analfabetos absolutos, sem qualquer habilidade de leitura ou escrita. Apenas 1 entre 4 brasileiros consegue ler, escrever e utilizar essas habilidades para continuar aprendendo.

É o que nos relatam a Ação Educativa e o Instituto Paulo Montenegro através do INAF – Indicador de Analfabetismo Funcional.

Um novo olhar sobre o seu mar de consumidores populares e você os verá com muita dificuldade de interagir com o que você tem para apresentar, caso você tenha condições financeiras de se valer das convencionais práticas de comunicação.

Ou seja, o panfleto bonitinho e bem explicadinho. Ou a mensagem engraçada no rádio. Ou ainda o testemunhal de 30 segundos de uma personalidade famosa, nas redes de TV.

Você jogará o pouco dinheiro que não tem fora ao perceber que "o analfabeto funcional não consegue extrair o sentido das palavras, colocar ideias no papel por meio da escrita, nem fazer operações matemáticas mais elaboradas".

Talvez fique feliz em saber que mesmo as grandes corporações, através de verbas publicitárias fabulosas, também enfrentam dificuldades de acessar esse público e, cada vez mais não sabem qual parte dos imensos gastos publicitários dá resultado.

E agora José? O que fazer?

Michael Shermer, em "O Outro lado da Moeda", Editora Campus, nos traz alguma esperança ao tratar o que denomina "efeito da validação subjetiva". Segundo o autor, ainda lidamos com decisões de consumo na linha dos nossos ancestrais da savana e "buscamos encontrar evidências confirmadoras em apoio a crenças já existentes e ignoramos ou reinterpretamos evidências que não as confirmam", no ensina no capítulo "Cuidando do nosso dinheiro".

Ou seja, ricos ou pobres, analfabetos funcionais ou não, buscamos enquanto consumidores as referências que confirmem nossas decisões de compra a partir as nossas vivencias sociais, culturais e religiosas.

Oportunidades emocionais

É aí que surge uma imensa oportunidade de o novo empreendedor conseguir vincular seus produtos e serviços com os bolsos dessa nova classe média. Mas terá que aprender o caminho das emoções, que elimina as imensas barreiras de entendimento conceitual, que o analfabetismo funcional estabelece.

"Através da emoção é que contagiamos esse novo consumidor", explica Douglas Quirino, vendedor de forros, divisórias e móveis, da Divicenter, com grande atuação no Grande ABC.

E se exige um mínimo de expertise para fugir das explicações conceituais que servia para vender para a elite mas que não se ajusta à grande massa. No meio do povão, mesmo com salário e crédito para consumo, é importante o novo empreendedor aprender a respeitar a busca da evidência confirmadora do seu freguês no seu próprio meio enquanto amadurece a compra de determinada mercadoria ou serviço.

Nos mergulhos rotineiros que fazemos através da Agência Consumidor Popular descobrimos que a vivência nos bairros e nas conduções, as trocas de mensagens via celular, as conversas paralelas ao longo dos cultos religiosos é o caldo emocional que define o destino de muitos produtos ou serviços.

As escolas de línguas e de informática nas periferias enfrentam um grave problema quando não conseguem entregar para os novos alunos a eficiência prometida na sua propaganda.

Porque, muito mais do que é divulgado nas suas campanhas publicitárias, geralmente organizadas pela matriz franqueadora, os alunos que são os primeiros a se matricular nessas escolas, se transformam em validadores para a comunidade. E o que se ouve, como ouvi, é que "nessa escola mesmo de graça ainda seria perda de tempo".

Busque testemunhos na comunidade

Uma saída para os empreendedores com pouca ou nenhum verba publicitária, mas com uma mercadoria ou serviço que acreditam ajustada às necessidades da base da pirâmide é aprender a identificar os formadores de opinião dos seus nichos de consumidores.

Eles e elas, jovens e velhos, estão sempre mais ou menos nos mesmos locais: igrejas, campos de futebol, bailes funks, linhas de ônibus e de trens de longo percurso. Conversam, trocam ideias, confirmam experiências. E respeitam, preferencialmente, suas lideranças comunitárias, culturais e religiosas. Que são os confirmadores de novas crenças e de hábitos, inclusive os de consumo.

UOL Cursos Online

Todos os cursos